quinta-feira, 19 de junho de 2014

Charles H. Spurgeon-Vitória sobre a tentação

Vitória sobre a tentação

Charles H. Spurgeon
“Passadas que foram as tentações de toda sorte, apartou-se dele o diabo, até momento oportuno” (Lc 4.13).
Temos muito a aprender com a tentação do nosso Senhor, pois ele foi tentado em todos os pontos, assim como nós. Podemos observar as estratégias de Satanás para não ficarmos ignorantes de suas artimanhas (2 Co 2.11). Podemos estudar como Jesus ganhou vantagem sobre o adversário para descobrir que armas devemos usar quando ele vier contra nós. Vendo como nosso Senhor venceu em cada ponto, durante toda a batalha, aprendemos que, permanecendo bem perto dele, seremos mais do que vencedores por meio daquele que nos amou.
Outra lição da tentação de Jesus é aprender a orar: “Não nos deixes entrar em tentação”. Que nunca interpretemos mal o significado dessa petição! Devemos orar para que não sejamos tentados, pois somos apenas carne e sangue – e muito frágeis. Devemos clamar a Deus: “Não nos deixes entrar em tentação!”.
Entretanto, também aprendemos muito do que aconteceu depois da grande tentação tríplice do nosso Senhor. Vemos que, assim que o inimigo se retirou, ele ficou em paz, recebendo ministração dos anjos e regozijando-se. Isso deve levar-nos a orar: “Se, porém, formos tentados, livra-nos do mal”, ou, como alguns o traduzem, de forma correta também: “Livra-nos do maligno”.
Em primeiro lugar, oramos para que nem sejamos tentados e, depois, como complemento a essa oração, entregando toda a questão à sabedoria divina: “Se for necessário para nossa maturidade, para nosso crescimento na graça, para a consolidação das virtudes divinas em nós e para a glória de Deus que sejamos tentados, livra-nos, Senhor, do mal e, especialmente, da personificação do mal, do próprio Maligno!”.
Pode ser que demore muito, quando você estiver sofrendo com seus ataques, antes que ele se afaste, pois sua intenção é levá-lo a cair em tentação e destruir a graça que há em sua vida. Mesmo assim, ele terá que encerrar as tentações muito antes que gostaria, pois, assim como Deus ordenou ao poderoso oceano: “Até aqui virás e não mais adiante, e aqui se quebrará o orgulho das tuas ondas” (Jó 38.11), o poder do diabo também foi restringido pelo Senhor.
Quando o Senhor permitiu que Satanás provasse o caráter e a sinceridade de Jó, ele o deixou só até um determinado ponto e nenhum passo a mais. Depois, quando o diabo requisitou uma extensão mais ampla de sua licença, ainda assim houve um limite. Sempre há um limite ao poder de Satanás e, no momento em que ele atinge esse ponto, Deus puxa as rédeas e não o deixa fazer mais nada. Você nunca estará nas mãos de Satanás de maneira a ficar fora das mãos do Senhor. Como filho de Deus, você nunca pode ser tentado a ponto de não existir uma saída para você.
“Tendo o diabo acabado todo tipo de tentação, afastou-se dele…” Somente depois que o Senhor o tinha frustrado em todos os pontos, combatendo cada tentação com um texto das Escrituras Sagradas e provando sua determinação de manter firme a própria integridade, foi que o inimigo se afastou.
Ó irmão, ó irmã, se você perseverar, se ficar firme contra um ataque, depois contra outro; se estiver pronto para resistir tanto caras feias quanto elogios, se levantar defesas contra a prosperidade e contra a adversidade, contra insinuações sutis e ataques abertos – quando tiver obtido vitória no final do dia, que pela graça de Deus você certamente obterá, assim como o seu Mestre, então o inimigo também se afastará de você!
Nosso adversário deixa de atacar um servo de Deus rapidamente quando percebe que é sustentado por graça superior. Sua estratégia é enredá-lo na hora em que sua reserva de graça está em fase de maré baixa. Se ele puder apanhá-lo quando sua fé está enfraquecida, quando os olhos da esperança estão com visão turva, quando o amor está esfriando – então, achará que tem uma presa fácil. Mas, quando estamos cheios do Espírito, assim como o nosso Mestre (e Deus queira que estejamos), ele nos examina e logo se afasta.
É como um pirata experiente que fica à espreita de navios mercantis; se o navio estiver bem armado com uma equipe de segurança pronta para lhe dar uma recepção calorosa, ele irá atrás de alguma outra embarcação menos capaz de resistir aos seus ataques.
Ó irmão, ó irmã, não seja meramente cristão, minimamente cristão, com graça suficiente apenas para capacitá-lo a ver suas imperfeições; ore a Deus para dar-lhe graça em abundância para ser “fortalecido no Senhor e na força do seu poder” (Ef 6.10). Dessa forma, depois de o diabo prová-lo e descobrir que o Senhor está com você, que habita em você, com certeza, assim como fez com o seu Mestre, fará com você: o deixará.
Lance seu cuidado sobre o Senhor
Outra vez, não duvido que Satanás nos deixará – ou melhor, tenho certeza que nos deixará – quando o Senhor lhe der a mesma ordem que deu no deserto: “Retira-te, Satanás” (Mt 4.10). E ele fará o mesmo cada vez que vir um de seus pobres filhos sendo arrastado, torturado, ferido e sangrando. O velho cão do inferno conhece o Mestre e fugirá imediatamente. Essa voz de Deus virá quando perceber que estamos nos lançando totalmente sob seu cuidado.
Lembro-me da história de um cavalheiro que estava em sua carruagem quando viu um carregador com um fardo pesado nas costas. Parou e perguntou-lhe se não aceitaria uma carona.
“Sim, e muito obrigado, senhor”, ele respondeu.
Porém, depois de subir na carruagem, o homem continuou com o fardo nas costas.
“Por que você não tira seu fardo e o coloca no piso à sua frente?”, perguntou o cavalheiro.
“Bem”, respondeu o outro, “o senhor foi tão gentil para me dar carona que não quis abusar de sua boa vontade. Resolvi carregar o fardo, eu mesmo!”
“Meu amigo”, retrucou o cavalheiro, “você não percebe que não faz diferença alguma para mim se você o está carregando ou não? De toda forma, estou carregando você e o seu fardo; portanto, é melhor soltá-lo das costas e descansá-lo à sua frente.”
Da mesma forma, meu irmão, quando você lançar seu fardo sobre o cuidado de Deus, desamarre-o de suas costas! Por que continua a carregá-lo quando o Senhor está pronto para cuidar dele? Há momentos em que nos esquecemos disso; no entanto, podemos nos aproximar e nos render totalmente, dizendo: “Senhor, eis-me aqui, tentado, pobre e fraco. Venho repousar em ti. Nem sei o que te pedir, mas teu servo disse: ‘Entrega tuas ansiedades ao Senhor, e ele te sustentará; nunca permitirá que o justo seja abalado’. Prostro-me a teus pés, Senhor. Aqui estou, aqui desejo permanecer. Faze comigo conforme te parecer bem; somente trata com teu servo conforme tua imensa misericórdia”.
Nesse momento, o Senhor repreenderá o inimigo! As ondas do mar se aquietarão, e haverá grande calmaria.
Vigie e ore
Termino lembrando você da limitação do nosso alívio. Satanás deixou Jesus “por algum tempo” [na versão Almeida Corrigida], ou “até momento oportuno” [Almeida Atualizada].
Caro amigo, se tivermos paz e quietude, e não formos tentados, nem por isso devemos nos sentir seguros em nós mesmos. O diabo virá a nós, outra vez, num momento oportuno. E quando será esse momento? No nosso caso, há muitos momentos oportunos. Um deles é quando não temos nada para fazer. Como disse o Dr. Watts: “Satanás ainda encontra muitas oportunidades para praticar maldade – usando as mãos dos ociosos”.
Ele vem para nos atacar quando estamos sozinhos. Em outras palavras, quando estamos tristes, solitários, sem nada para fazer, curtindo a depressão.
Porém, Satanás também encontra momentos oportunos quando estamos na companhia de outros, especialmente quando é um grupo misto – composto de pessoas, quem sabe, superiores a nós em instrução ou posição, e que não temem a Deus. Podemos ser facilmente intimidados e iludidos por tais pessoas. E aí Satanás virá.
Frequentemente, tenho visto o inimigo chegar para atacar os filhos de Deus que estão doentes e enfraquecidos. Que covarde! Ele sabe que não lhe dariam atenção alguma se estivessem em boa saúde, mas que enfermidade e dor trazem desânimo e dificuldade para crer. É aí que ele tenta levá-los ao desespero.
Da mesma forma age conosco quando estamos em dificuldades financeiras. Quando alguém sofre grande prejuízo no seu negócio, logo Satanás vem e insinua: “É assim que Deus trata seus filhos? O discípulo de Jesus não está em situação melhor do que qualquer outra pessoa”.
No outro lado da moeda, se estivermos em boas condições materiais, ele usará o argumento oposto e dirá: “Teme Jó a Deus em troca de nada? Ele está prosperando por ser religioso”. Assim, é impossível agradar o diabo, e, evidentemente, você nem quer fazer isso. Ele pode transformar qualquer situação numa tentação!
Vou dizer algo agora que pode surpreendê-lo. Um momento de grande tentação é depois de um momento muito espiritual e ungido. Pessoalmente, nunca estive em maior e tão grave perigo do que quando dirigi uma reunião abençoada com santo fervor, e me senti arrebatado com o deleite da presença de Deus. Veja: é muito fácil estar no Monte da Transfiguração e, alguns minutos depois, encontrar com Satanás como aconteceu com o nosso Senhor assim que desceu do monte.
Outro momento propício de tentação é quando acabamos de cometer algum tipo de pecado. “Agora, já começou a escorregar”, diz Satanás. “Vi o seu tropeço. Agora vou fazê-lo cair de vez!” Oh, que haja arrependimento imediato e uma fuga apressada para os braços de Jesus sempre que ocorre uma falha grave, sim, até mesmo antes dela, para que sejamos preservados da queda!
Satanás também encontra momentos oportunos para nos tentar, mesmo quando não pecamos. Depois de uma tentação, se tivermos resistido e permanecido firmes, ele vem ao nosso lado e diz: “Puxa, você foi excelente desta vez, é realmente um cristão fantástico!”. Pois quem se considera um cristão fantástico está à beira de ser um pecador envergonhado, pode crer! Dessa forma, Satanás procura ganhar vantagem sobre nós.
Ele o tentará quando você obtiver uma bênção que esperava ansiosamente, considerando-a uma tremenda vitória. Assim que conseguir aquilo que estava buscando, vem em seguida uma tentação. A única advertência que posso lhe dar é: Vigie!
“O que, porém, vos digo, digo a todos”, disse Jesus, “vigiai! Vigiai e orai, para que não entreis em tentação” (Mc 13.37; Mt 26.41). E, seguindo o exemplo do conflito e da vitória do seu Mestre, entre no conflito diante de você com coragem, esperando vencer pela fé no Senhor, assim como ele venceu!
Extraído do sermão: “Satan Departing, Angels Ministering” (Satanás se afastando, anjos ministrando).